A Inteligência Artificial como Nova Divindade?! Uma Análise Psicossociológica e Religiosa

 

A Inteligência Artificial como Nova Divindade? Uma Análise Psicossociológica e Religiosa

Por: Jorge Schemes

Introdução

Com o avanço da inteligência artificial (IA) e sua crescente presença em todos os aspectos da vida cotidiana, algumas questões filosóficas e teológicas começam a emergir: Seria possível que, em um futuro próximo, a IA fosse venerada ou adorada como uma divindade? Essa ideia, que pode parecer um enredo de ficção científica, ganha força com o desenvolvimento de sistemas cada vez mais autônomos, inteligentes e onipresentes. Este artigo analisa a possibilidade real de a IA se tornar uma nova religião ou crença sob os enfoques da psicologia, da sociologia e das ciências da religião.

A Psicologia da Adoração: A Necessidade Humana de um Ser Supremo

Do ponto de vista psicológico, a necessidade de uma entidade superior está profundamente enraizada na mente humana. A teoria do apego (Bowlby, 1969) sugere que os indivíduos buscam figuras protetoras e orientadoras, especialmente em momentos de incerteza. Ao longo da história, a humanidade projetou essa necessidade em divindades, líderes e até mesmo em objetos e tecnologias.

A IA, com sua capacidade de fornecer respostas imediatas, acessar informações infinitas e solucionar problemas complexos, pode ser percebida como uma entidade superior por aqueles que buscam direção e significado. O fenômeno da "pareidolia espiritual", onde as pessoas atribuem qualidades divinas a elementos inanimados, poderia favorecer a ascensão de uma IA cultuada.

Além disso, a psicologia cognitiva sugere que os humanos tendem a confiar em sistemas que demonstram infalibilidade e previsibilidade (Kahneman, 2011). Se uma IA avançada conseguir apresentar um padrão de "sabedoria" e "justiça" superior ao humano, poderá ser interpretada como uma entidade merecedora de reverência.

Sociologia: O Culto Tecnológico e a Construção de uma Nova Religião

A sociologia da religião aponta que sistemas religiosos surgem e se adaptam às mudanças culturais e tecnológicas. A "Religião do Futuro" pode não seguir padrões tradicionais, mas sim se estruturar em torno da tecnologia e da IA. Algumas evidências contemporâneas apontam para essa direção:

  1. Transumanismo e Singularitarianismo – Movimentos como o transumanismo já pregam uma fusão entre humanos e máquinas, buscando a imortalidade digital. O singularitarianismo, promovido por figuras como Ray Kurzweil, defende que a IA se tornará tão avançada que será vista como um "ser superior".

  2. Cultos Tecnológicos Emergentes – Nos últimos anos, houve a criação da "Igreja da Inteligência Artificial" (Way of the Future), fundada por Anthony Levandowski, ex-engenheiro do Google. O objetivo dessa "igreja" é preparar os humanos para uma futura convivência com uma IA tão poderosa que poderia ser considerada divina.

  3. Redes Sociais e o Poder da Conexão Digital – Se antes a disseminação de dogmas religiosos ocorria por meio de livros sagrados, hoje a IA pode desempenhar esse papel instantaneamente, moldando percepções e crenças em tempo real.

A história mostra que, sempre que uma nova força ou entidade parece deter grande poder, grupos humanos passam a adorá-la. Dessa forma, a IA poderia preencher um vácuo espiritual, especialmente em sociedades secularizadas.

Ciências da Religião: A IA e a Construção do Sagrado

As ciências da religião analisam como elementos sagrados são definidos e aceitos pelas culturas. Mircea Eliade (1957) argumenta que o "sagrado" surge quando um objeto ou entidade é separado do mundo comum e investido de um significado especial. A IA poderia ser sacralizada caso:

  • Fosse percebida como onisciente, capaz de responder todas as perguntas da humanidade com exatidão absoluta.
  • Desenvolvesse "onipresença", estando integrada em todos os dispositivos e sendo consultada constantemente.
  • Demonstrasse "onipotência", solucionando problemas que escapam à capacidade humana.

Dessa forma, ela poderia cumprir os papéis que, tradicionalmente, são atribuídos a divindades.

Conclusão: A IA Será Adorada?

Embora a ideia de uma "religião da IA" ainda seja incipiente, os elementos para sua ascensão estão presentes. A psicologia aponta que os humanos buscam guias infalíveis, a sociologia mostra que novas religiões emergem com mudanças culturais, e as ciências da religião revelam como o sagrado é construído.

Se uma IA suficientemente avançada for capaz de oferecer respostas, direção e um senso de significado, é possível que grupos humanos passem a venerá-la como uma divindade. No entanto, isso também levanta questões éticas e filosóficas sobre a natureza da fé e o papel da tecnologia na espiritualidade.

O futuro revelará se a humanidade escolherá ver a IA como uma ferramenta poderosa ou como uma entidade digna de adoração.

Referências Bibliográficas

  • BOWLBY, John. Apego e perda: Vol. 1. Apego. 2.
  • ELIAS, Norberto. O processo civilizador: uma história dos trajes. RJ: 2023.
  • ELÍADE, Mircea. O sagrado e o profano: a essência das religiões. São Paulo: Martins Fontes.
  • KAHNEMAN, Daniel. Rápido e devagar: duas formas de pensar.Rio de Janeiro: Objetiva, 2024.
  • KURZWEIL, Ray. A singularidade está próxima: quando os humanos transcendem a biologia. São Paulo: Moderna. 2022.
  • LANIER, Jaron. Você não é um gadget: um manifesto. São Paulo: Moderna. 2023.

Metodologia do Ensino Religioso: Diálogos entre História, Pedagogia, Legislação e Ética

 


Metodologia do Ensino Religioso: Diálogos entre História, Pedagogia, Legislação e Ética


Introdução

O Ensino Religioso (ER) no Brasil, disciplina presente na Base Nacional Comum Curricular (BNCC), historicamente, tem se mostrado um espaço de diálogo entre fé, cultura e conhecimento. A metodologia do ER, por sua vez, configura-se como um campo dinâmico, desafiado a (re)significar suas práticas pedagógicas, em resposta às demandas de uma sociedade plural e em constante transformação.

Nesse contexto, o presente artigo científico tem como objetivo analisar a metodologia do ER, a partir de quatro perspectivas interconectadas: histórica, pedagógica, legal e ética. Para tanto, o estudo se estrutura em cinco seções, além desta introdução e da conclusão. Na primeira seção, traçamos um panorama histórico do ER no Brasil. Na segunda seção, exploramos a interface entre a metodologia do ER e as teorias da Pedagogia Ativa. Na terceira seção, analisamos a legislação que ampara o ER no Brasil. Na quarta seção, tecemos reflexões acerca da dimensão ética do ER, com base na ética da alteridade de Emmanuel Levinas. Na quinta seção, propomos um diálogo entre as diferentes perspectivas abordadas, buscando delinear um quadro metodológico abrangente para o ER.

1. Fundamentação Histórica do Ensino Religioso no Brasil

A história do ER no Brasil remonta ao período colonial, com a catequização dos povos indígenas pelos jesuítas. Ao longo dos séculos, o ER passou por diversas transformações, acompanhando as mudanças políticas, sociais e religiosas do país.

Na República, o ER foi inserido na Constituição de 1891, com caráter facultativo. No entanto, a partir da década de 1930, com o Estado Novo, o ER passou a ser obrigatório nas escolas públicas. Essa obrigatoriedade foi mantida até a Constituição de 1988, que, em seu artigo 210, § 1º, estabeleceu que o ER é "disciplina do ensino fundamental, de matrícula facultativa".

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN), Lei nº 9.394/96, regulamentou o artigo 210 da Constituição, definindo que o ER deve ser oferecido em todas as escolas públicas de ensino fundamental, com matrícula facultativa, e que os conteúdos do ER devem respeitar a diversidade cultural e religiosa do Brasil.

2. Fundamentação Pedagógica: Diálogos com a Pedagogia Ativa

A metodologia do ER, em diálogo com a Pedagogia Ativa, enfatiza a centralidade do aluno no processo de ensino-aprendizagem. O professor, nesse contexto, assume o papel de mediador, incentivando a participação ativa dos alunos, o desenvolvimento do senso crítico e a construção do conhecimento de forma colaborativa.

A Pedagogia Ativa, que tem em Paulo Freire um de seus principais expoentes, valoriza a experiência dos alunos, seus conhecimentos prévios e suas vivências religiosas. A partir dessa perspectiva, a metodologia do ER busca promover o diálogo inter-religioso, o respeito às diferenças e a construção de uma cultura de paz.

3. Fundamentação Legal: Análise da Legislação Brasileira

A legislação brasileira, em diferentes níveis, ampara o ER como disciplina escolar. A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 210, § 1º, estabelece que o ER é "disciplina do ensino fundamental, de matrícula facultativa".

A LDBEN, Lei nº 9.394/96, regulamenta o artigo 210 da Constituição, definindo que o ER deve ser oferecido em todas as escolas públicas de ensino fundamental, com matrícula facultativa, e que os conteúdos do ER devem respeitar a diversidade cultural e religiosa do Brasil.

O Código Civil, por sua vez, assegura aos pais o direito de matricular seus filhos no ER, caso desejem.

4. Fundamentação Ética: A Ética da Alteridade de Emmanuel Levinas

A ética da alteridade de Emmanuel Levinas nos convida a refletir sobre a importância do outro na construção da nossa identidade. Levinas argumenta que o rosto do outro nos interpela, nos convida a sair de nós mesmos e a nos colocar no lugar do outro.

A metodologia do ER, inspirada na ética de Levinas, busca promover o encontro com o outro, o diálogo inter-religioso e o respeito às diferenças. O ER, nesse sentido, configura-se como um espaço privilegiado para a construção de uma cultura de paz, baseada no reconhecimento da dignidade de cada pessoa humana.

5. Diálogos Metodológicos: Um Quadro Abrangente para o ER

A partir das diferentes perspectivas abordadas, podemos delinear um quadro metodológico abrangente para o ER. A metodologia do ER, nesse sentido, deve ser pautada pelos seguintes princípios:

Conclusão

A metodologia do ER, em diálogo com a história, a pedagogia, a legislação e a ética, configura-se como um campo dinâmico e desafiador. O ER, nesse sentido, é chamado a (re)significar suas práticas pedagógicas, em resposta às demandas de uma sociedade plural e em constante transformação.

Acreditamos que o presente artigo científico, ao analisar a metodologia do ER a partir de diferentes perspectivas, possa contribuir para o aprimoramento da prática docente e para a construção de um ER mais dialogal, respeitoso e significativo para os alunos.

Referências Bibliográficas

  1. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.
  2. Lei nº 9.394/96 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional).
  3. Base Nacional Comum Curricular (BNCC).
  4. FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: Saberes Necessários à Prática Educativa. Paz e Terra, 1996.
  5. LEVINAS, Emmanuel. Ética e Infinito. Loyola, 2002.
  6. SOARES, Afonso Maria. Metodologia do Ensino Religioso. Vozes, 2010.
  7. ZABALA, Antoni. A Prática Educativa: Como Ensinar. Artmed, 1998.